A bagunça da atual administração da política econômica. Miriam
Leitão. O Globo pode levar anos para consertar o que a bagunça da atual
administração da política econômica do Brasil tem feito. Aos poucos, está sendo
dilapidado o patrimônio de solidez fiscal do país.
Com truques contábeis,
jeitinhos, mudanças de regras, invenções, o ministro Guido Mantega está minando
o que o Brasil levou duas décadas para construir: a base da estabilização.
De todos os erros do ministro, esse é o pior. Mantega está
tirando a credibilidade dos números das contas públicas. Mesmo quem acompanha o
assunto já não sabe mais o valor de cada número que é divulgado.
O governo autorizou o resgate antecipado de R$ 12,4 bilhões
do Fundo Soberano. Isso é 81% de um dos fundos do FSB. Além disso, o BNDES
pagou R$ 2,3 bilhões e a Caixa R$ 4,7 bilhões, definindo esse dinheiro como
dividendo antecipado para o Tesouro.
Está fabricando dinheiro. O Tesouro se endivida, manda o
dinheiro para os bancos públicos, depois extrai deles recursos antecipados,
alegando serem dividendos de balanços ainda nem fechados. Os recursos são
registrados como arrecadação no fechamento das contas do ano. É estelionato
fiscal.
Foram tantos truques em que dívida do Tesouro virou receita
do governo para fingir o cumprimento de metas fiscais que hoje ninguém sabe
dizer qual parte é confiável dos números que o governo divulga.
Só com truques, deferimentos, transformismos e abracadabras,
o Ministério da Fazenda conseguiu chegar à meta do ano.
A Caixa recebeu dinheiro público recentemente, e agora está
antecipando dividendos ao Tesouro. A capitalização foi feita para fortalecer a
instituição centenária da fragilidade financeira em que ficou após operações
como a compra de 49% de um banco falido, no qual teve depois que despejar mais
dinheiro.
As transferências para o BNDES aproximam-se de R$ 300 bi.
Nascem como dívida, viram empréstimo subsidiado, e depois dividendo antecipado
para o Tesouro. Com manobras circulares assim que se montou o mais nefasto e
inflacionário dos mecanismos do passado, a conta movimento.
O Fundo Soberano era para ser um fundo de longo prazo onde
fosse feito um esforço extra de poupança para momentos de crise. Em 2012 o país
não cresceu, mas não foi ano exatamente de crise.
A mudança da Lei de Responsabilidade Fiscal é um atentado à
viga mestra do edifício que os brasileiros construíram para ter uma moeda
estável.
Se a Fazenda considera que o custo da dívida dos entes
federados ficou incompatível com a atual taxa de juros no Brasil, precisa abrir
um debate amplo, sério e transparente para se encontrar a saída sem fazer
rachaduras na sustentação da estabilidade.
Na época da renegociação, foram oferecidas duas taxas de
juros aos devedores: quem fizesse um ajuste prévio pagaria 6%, quem não
quisesse fazer pagaria 9%. A prefeitura de São Paulo escolheu não se ajustar e
pagar mais. Agora, o governo está oferecendo a todos os juros de 4%.
A conta dos desatinos fiscais da atual equipe econômica
chegará, mas quando os autores das artimanhas contábeis não estiverem mais lá
para responder. Como sempre, a conta cairá sobre a população.
O governo militar inventou artefatos de fabricação de
dinheiro que produziram inflação. A democracia consumiu uma década para
desarmar essas bombas. Os riscos a que o governo tem exposto o país são
enormes.
Era preferível o governo ter simplesmente admitido que em
2012, arrecadou menos do que previa e, por isso, não pôde cumprir a meta. Ao
mesmo tempo, se comprometeria a fazer esforço extra em ano de maior
crescimento. E ainda há a dívida de 2
trilhões de reais que as futuras gerações não terão como pagar. Autor: Miriam
Leitão: Difusão: Geraldo Porci de Araújo. 21/01/2013.
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