Omitirei
o nome da publicação e dos autores do artigo que vou criticar. Não me parece
sensato divulgar fontes de equívocos. Direi apenas que se trata de uma
publicação "católica" e que o artigo abordava o tema da corrupção,
definindo a ética do "ganhar sempre mais", que seria própria do capitalismo,
como determinante da corrupção.
Tal
tese é um disparate sob quaisquer ângulos de observação e os autores devem
saber. Mas estão se lixando. O que pretendem é levar os leitores a extrair
conclusão errada de premissa falsa: se o capitalismo causa corrupção, então, na
vigência de seu antônimo - o socialismo - a sociedade se conduziria por
elevadíssimos valores morais. Um verdadeiro paraíso reconstruído. Ora, o desejo
de ganhar mais não é uma especificidade da economia de mercado, ou livre, ou de
empresa (prefiro designar o sistema econômico com esses nomes que lhe atribuiu
João Paulo II). É um anseio da pessoa humana, em todos os tempos e em qualquer
sistema. Resumamos o assunto, então, em alguns tópicos.
Ovídio
que os redatores dessa fraude intelectual recusem um aumento de salário, um bom
negócio ou uma oportunidade de comprar por menos ou vender por mais. Como
consequência de um sistema de economia livre, de empresa, os agentes econômicos
dedicam-se com maior empenho ao que fazem, a criatividade aumenta, a
produtividade cresce, os custos decrescem. Beneficiam-se produtores e
consumidores.
Gera-se
uma saudável consequência ética pois a competência é premiada com resultados
positivos e a incompetência punida com prejuízos.
Há
uma relação histórica, ademais, entre economia de mercado e democracia pois o
grande senhor da economia de mercado é ele mesmo, o mercado, formado por
milhões e milhões de pessoas, com suas expectativas, anseios, etc..
Contudo,
estava certo o papa João Paulo II quando, escrevendo sobre o tema, ensinava que
se o núcleo da liberdade for apenas econômico – e não ético e religioso (papel
das instituições políticas e jurídicas) – ocorrem situações de opressão
econômica, formam-se monopólios, cartéis, mecanismos de corrupção, e outras
enfermidades sistêmicas. Com efeito, absolutamente livre, o mercado padece dos
mesmos males que acometem a liberdade individual na ausência de toda restrição.
Nas
economias planificadas, socialistas, o anseio de “ganhar mais” é tolhido pela
centralização estatal. Como consequência – e a história o demonstrou com muita
clareza – a produtividade diminui, a iniciativa acaba a economia fica estagnada, a pobreza se
multiplica de modo irremediável, o muro cai, os governos tombam, os
intelectuais do socialismo se escondem. O fracasso socialista é tão óbvio que
Leão XIII o previu três décadas antes de esse sistema ter, sido tentado na
Rússia. E João Paulo II, tendo vivido sob tal realidade, proclamou-o “falido”.
Da
mesma forma que existe uma relação direta entre democracia e economia de
mercado, existe, também, uma relação direta entre economias planificadas e
totalitarismos. E a razão é simples: para coibir aquele desejo natural de
“ganhar mais”, torna-se necessário criar uma estrutura estatal opressiva.
Quando se concentram no Estado tanto o poder político quanto o econômico,
nenhum poder resta à sociedade e à pessoa na sociedade.
Ademais,
com a queda do Muro, foi possível conhecer o nível de corrupção instalado nas
repúblicas socialistas, corrupção que também se espraia pela sociedade como
defesa perante a escassez e a miséria geral. Quem quiser conhecer isso de
perto, ainda hoje, vá a Cuba (onde fui três vezes), ou à Coréia do Norte (onde
não tenho coragem de ir).
Bastariam estas poucas evidências para
desmascarar a malícia do texto a que me refiro. Mas há nele um erro ainda
muito mais grave: como pode um cristão afirmar que o capitalismo corrompe (e
levar o leitor a presumir que o socialismo purifica), como se nele se
extinguisse o pecado original? Corrupção existe em qualquer sistema político ou
econômico, embora alguns a favoreçam mais do que outros. E, nesse caso, o
socialismo e os totalitarismos são imbatíveis. Mas em quaisquer regimes ou
sistemas existe o pecado, os que a ele se entregam, e os justos que se empenham
em serem bons. Se tudo fosse questão de sistema, Cristo teria proposto um, em
vez de perder seu tempo propondo-se a si mesmo, ao custo em que o fez.
Autor:
Percival Puggina (67) é arquiteto,
empresário, escritor, titular do site www.puggina.org,
articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de
Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.
Difusão: Geraldo Porci de Araújo,
23/04/20125.
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