Sempre
me pareceu que o provimento de vagas no STF por indicação presidencial não era
um modelo de todo mau. Mesmo que tal discricionariedade tornasse inevitável a
designação de juristas alinhados com as posições ideológicas do governante, o
pêndulo dos processos sucessórios, indo ora para cá, ora para lá, ajudaria a
estabelecer certo pluralismo dentro da Corte. Era o que eu pensava. Todavia, a
reeleição introduzida por FHC e o petismo no poder travaram o pêndulo na
posição esquerda. E o pluralismo acabou.
Por
isso, não consigo entender as manifestações da elite e da militância petista no
sentido de que o julgamento do mensalão está politizado. Quem conhece o partido
sabe que ele pode ser descuidado em muitas coisas, jamais, porém, quando se
trata de prover cargos importantes. Como regra quase geral, as indicações ao
Supremo, feitas por Lula e Dilma, seguiram um alinhamento nem sempre
partidário, mas política e filosoficamente compatível com as posições do
partido. Por isso, o STF, nos últimos anos, definiu diversos temas polêmicos em
conformidade com os gostos do petismo. Listo alguns: as posições relativas ao
caso de Cesare Battisti, transferindo a decisão a Lula e, depois, determinando
que o terrorista fosse posto em liberdade; o reconhecimento da união estável
entre pessoas do mesmo sexo; a orientação sobre a aplicação de algemas em
presos; o beneplácito ao uso de células-tronco embrionárias para pesquisas; a
aceitação da constitucionalidade das cotas raciais no ensino superior; a
determinação relativa à reserva Raposa Serra do Sol; a liberação da marcha dos
maconheiros; o reconhecimento da constitucionalidade da lei do piso do
magistério. Nesses casos, e certamente noutros, os juízos emitidos agradaram
politicamente o PT e contrariaram valores relevantes para uma parcela da sociedade
que pensa diversamente. Tais entendimentos do STF decorrem dos critérios de
escolha adotados pelos governos petistas. Lula e Dilma, ao apontarem nomes para
as cadeiras vacantes, olham à sua volta. Ou olham para o lado esquerdo.
Numa
democracia - a menos que seja esquizofrênica. O partido, do governo fala como o
governo fala. Pois eis que, recentemente, o PT reagiu às condenações proferidas
na Ação Penal 470 através de um manifesto, no que foi seguido por dura
entrevista em que o presidente do partido declarou ser extinto nos votos dados
pelos ministros. Ora, de todas as decisões polêmicas do STF cujos votos
acompanhei, essa é a única que não está politizada! O que o partido e o governo
não entenderam é algo muito simples: uma coisa é os ministros indicados votarem
como o PT gostaria matérias do tipo a que me referi antes. Afinal, os
politizados ministros nomeados e o politizado partido nomeante sopram a mesma
partitura em flautas diferentes. Outra é pretender que numa ação criminal os
ministros decidam contra a razão, a lei e as evidências dos autos para
satisfazerem as conveniências do partido. Seria gravíssimo! Tão grave que tal
suspeita recai sobre apenas dois. Mas um deles ao menos conhece Direito. O
outro nem isso. Jamais deveria estar naquela Corte e, em hipótese alguma,
poderia participar do julgamento da Ação Penal 470. Só ele, no país, não sabe o
quanto está impedido de julgar pessoas de cuja intimidade privou e para as
quais trabalhou. Graças à toga que Lula lhe deu, mais cedo ou mais tarde, a roda
das cadeiras o fará presidente do Supremo. Meu Deus! Zero Hora, 02/12/2012.
Autor: Percival Puggina.
Difusão: Geraldo Porci de Araújo. 05/10/2012.
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