Vamos
ver se consigo. É muito difícil que uma dissertação sobre política não seja
lida sem que os leitores se instalem, provisoriamente ao menos, nas respectivas
trincheiras. O que hoje trago para este espaço, no entanto, é uma reflexão
sobre modos de ver a política que independem de devoções governistas ou
oposicionistas e de alinhamentos ideológicos por tal ou qual banda. Estou
fazendo uma aposta em que conseguirei ser entendido na perspectiva que proponho.
Vamos
lá. Todo governante, sentado na cadeira das decisões, se defronta com esta
questão: onde gastar os escassos recursos de que dispõe? Abrem-se, de hábito,
dois caminhos. Num deles, os recursos podem ser gastos na conservação do
estoque de bens públicos disponível, no aumento da oferta de serviços com
ampliação dos empregos do setor, nas despesas de custeio e na distribuição de
favores. No outro, priorizam-se os investimentos como forma de ampliar, através
deles, as perspectivas do futuro.
O
tema é relevante e se expressa na opção entre a possibilidade de governar mais
para o presente, é menos que é para o
futuro; ou de governar, mais para o futuro e menos para o presente. Numa
analogia bem singela, seria escolher entre comer feijão com arroz hoje ou
preparar uma feijoada para amanhã. A
experiência política mostra que o feijão com arroz é eleitoralmente mais bem
sucedido que a feijoada, embora a feijoada fique na memória e entre para a
história. Há muitos anos, muitos anos mesmo, a feijoada foi parar num canto
remoto do cardápio nacional - e no Rio Grande do Sul não é diferente - graças a
uma taxa de investimento incapaz de providenciar os mais modestos ingredientes
de uma feijoada que mereça essa designação. As propagandas oficiais podem
sobrevalorizar o que é investido, mas não passam disso mesmo: propaganda
oficial. Aponto para a falência da educação no país e não preciso dizer mais
nada para provar o que digo.
É
na bandeja do dilema aqui exposto que o prato da oposição é servido. Se o
governante optar pela feijoada, a oposição reclamará da falta do feijão com
arroz; se ele escolher o feijão com arroz, a oposição cobrará a feijoada. E não
há como escapar desse conflito, a menos que – numa situação absolutamente
ilusória e imprudente - se proceda como se existissem recursos para fazer bem
as duas coisas. É a usina do endividamento, da insegurança e do descrédito.
Não
é por outra razão que a política deve ser confiada aos estadistas. Quem vota em
qualquer um por razões menores deve, mesmo, ser governado por pigmeus. Para
cuidar apenas do custeio, um gerente serve; para decidir sobre investimentos,
precisa-se de um planejador; para escolher entre o bem e o mal basta; ter uma
consciência bem formada. Mas para priorizar despesas, escolher o mal menor
(porque o bem nem sempre está disponível ou acessível), fazer na hora certa a
opção correta entre custeio e despesa, se requer um estadista.
E
nós só os teremos quando os partidos compreenderem que eleição é um episódio do
processo democrático. A eleição passa, mas a política permanece.
E
a política só corresponderá às expectativas sociais quando os partidos se
preocuparem com formar (e os eleitores com eleger) estadistas. Eles existem e
estão por aí, cuidando de outras coisas,
porque a política não lhes dá espaço. Enquanto isso, ora falta feijão,
ora falta arroz e a feijoada virou um sonho. Zero Hora, 15/01/2012. Autor:
Percival Puggina. Difusão: Geraldo Porci
de Araújo. 15/01/2012.
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