Era um
entardecer do último mês de outubro. Eu caminhava ao longo do Malecón habanero,
nas proximidades da esplanada de concentrações que Fidel batizou de Tribuna
Anti-Imperialista. Ia pensando sobre a batida constante e incessante do mar
contra o conjunto formado pelos molhes, murada e calçadão que se desenrola ao
longo de Abala Veja, Vedado e Miramar, protegendo a cidade das ondas da Baía de
Havana. "Um dia o mar vencerá o muro", pensava, observando a analogia
entre a ação da natureza naquele local e o destino que, ao fim e ao cabo, terá
a revolução dos Castro. O Malecón envelheceu e a revolução (que faz 53 anos
hoje) estám velhas, e como velhos, e encarquilhados estas, os malfeitores, que
se apoderaram do país em 1959. Minhas meditações foram interrompidas.
"What do you thing about Cuba?", perguntou alguém. Era um jovem,
sentado sobre a murada. Falava com um sotaque hispânico. Sorri pela
coincidência entre a indagação e os meus pensamentos.
"Penso
que um dia o mar vencerá o muro", respondi metaforicamente em espanhol.
Fui instado a esclarecer. Meu interlocutor era um cubano, jornalista em Los
Angeles, que estava visitando os pais. Nossas observações coincidiam. Passados
nove anos da minha última visita, eu retornava a Cuba, curioso com as notícias
sobre reformas modernizantes. Qual o quê! Tudo em Cuba piorara com o tempo e a
sociedade estava tomada por visível melancolia. O próprio Malecón, que já vi
fervilhante de turistas e gente da terra, estava, dez anos mais deteriorado e
expressava essas realidades na pequena afluência. Para aquele rapaz, que teve a
sorte de conseguir sair "na boa" (o que lhe permitia retornar sempre
que quisesse), a situação era tão deprimente quanto eu a via.
Relatei-lhe
minhas observações e algumas coisas que já ouvira. "Câmbios? No hay
cambios!", asseguravam-me os cubanos com quem falara. E essa talvez fosse
a fonte de todas as melancolias. Um dia era igual ao anterior, um ano igual ao
anterior, e o próximo dia, assim como o próximo ano não serão iguais aos já, dos
passados. É como se o tempo transcorresse sem outro resultado que não fosse o
de fazer estragos. Não há ladrão mais maldito do que o ladrão das esperanças do
povo. E não há governo mais pernicioso do que o governo que impõe a todos, a
ferro e propaganda, a obrigação de viver, no cotidiano, o pesadelo dos seus
sonhos e o fracassado delírio das suas utopias.
Há
em Cuba multidões de desocupados. Mesmo entre os que têm empregos não há o que
fazer e a tarefa de consertar velharias caseiras talvez sejam a que envolve
maior tempo de trabalho efetivo no país. Mas isso não vale para os belos
prédios da antiga Pérola do Caribe. Como ninguém cuida das coisas sem dono, a
parte antiga de Havana lembra as imagens da cidade de Dresde em 1945 após o
ataque aéreo dos aliados.
As
demissões projetadas para o setor público - 1 milhão de trabalhadores - não
aconteceram porque os comitês que tratariam disso não se entendem. As
atividades abertas à iniciativa privada não encontram clientela porque a
sociedade tem baixíssima renda familiar média. É quase nada o que se pode fazer
com salários socialistas de 15 dólares por mês. Constrange saber que
autoridades brasileiras, periodicamente, vão soluçar sua nostalgia
revolucionária nos ombros de Fidel Castro.
Zero Hora,
1º de janeiro de 2012. Autor: Percival Puggina. Difusão: Geraldo Porci de Araújo.
O governo gaúcho
anunciou a realização de um concurso público para admissão de dez mil
professores e informou que 18% “dessas vagas, constituirão cota reservada a fordes
endentes". A melhor maneira de alguém se tornar racionalmente inepto é ser
politicamente correto. Incrível como a esquerda, que tanto detesta os Estados
Unidos, os ianques, os anglicismos e os americanismos, gosta de macaquear toda
tolice que surja por lá! A própria expressão, "politicamente correto"
(800 mil referências no Google) corresponde à tradução de political correctness
(10 milhões de referências no Google), tendo, ganho, nos, Estados Unidos, de
tão usada, a abreviatura PC.
Palavra afrodescendente (263 mil referências
no Google) é a forma que adquiriu no Brasil outro conceito. Born in USA -
"afro-american" (6,6 milhões de referências). No formato nacional,
virou um neologismo ainda mais ridículo, cuja etimologia diverge do significado
que lhe foi atribuído.
De
um lado, porque muito provavelmente todos os humanos são afrodescendentes,
originários do mesmo tronco africano. De outro, porque parcela numerosa da
população daquele continente é formada por árabes, egípcios e berberes, que têm
a pele clara. Ou seja: afrodescendente não quer dizer coisa alguma. Entender
tal vocábulo como significando "negro" é racismo em forma pura, não
miscigenada, pois dele se infere que a palavra substituída seja de algum modo,
depreciativa.
Não
é. Só é para quem for racista. Que a lei de cotas raciais (arre!) não
serve à justiça é coisa que poucos haverão de negar. Numa mesma rua de um mesmo
bairro pobre, dois vizinhos, estudantes da mesma escola pública, com os mesmos
mal remunerados professores, jogando futebol, descalços com a mesma bola de
meia prestam exame vestibular e tiram as mesmas notas.
Por
ser negro um consegue aprovação pela lei de cotas. O outro, por ser branco, não
se classifica. Isso é discriminação racial. Não acontece? Acontece até pior.
Escreveu-me outro dia um leitor relatando o caso de um vestibular para
disputadíssimo curso. Havia 40 vagas ao todo. O último classificado pelas cotas
fora o 142º lugar. O candidato que se classificou em 41º lugar ficou fora.
De
que modo isso serve à justiça? Ainda se poderia, com um senso bem elástico
sobre o que seja justo, tolerar um sistema de cotas para acesso ao ensino
superior que ponderasse a condição social num sentido amplo, mas ele envolveria
irrealizável trabalho de investigação e classificação. Pois bem, o governo
Tarso Genro reservará 1,8 mil vagas para negros no concurso para o magistério
público estadual. Neste caso, não se trata de favorecer a ascensão de um grupo
social presumivelmente desfavorecido (tal presunção, tomada pela cor da pele, é
realmente presunçosa).
Rata-se
de outra coisa porque todos os concorrentes às posições no magistério saíram,
com o canudo da mão, pelas mesmas portas escolares e universitárias. A cor da
pele, nesse sentido, é tão representativa de suas diferenças quanto o penteado
ou o sapato. Anuncia-se, então, um flagrante privilégio e uma ruptura com o
princípio da igualdade de todos perante a lei. Não bastasse isso, a cota racial,
vai na, contramão das promessas do governador Tarso Genro de qualificar o
ensino público para que o Rio Grande do Sul recupere as posições perdidas no
contexto da educação nacional.
Como
alcançar esse objetivo se a porta de entrada para o magistério vai levar em
conta a cor da pele e não o desempenho nas provas do concurso de seleção? Vão
ser politicamente corretos assim com o futuro deles mesmos e não com o futuro
do Rio Grande do Sul! Autor; Percival Puggina (67) é arquiteto, empresário,
escritor, titular do site www.puggina.org,
articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de
Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.
Difusão: Gerado Porci de Araújo.
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