quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

NEWSLETTER DO BLOG DO PERCIVAL PUGGINA

NEWSLETTER DO BLOG DO PERCIVAL PUGGINA
OS FATOS? ORA OS FATOS!
Quando explodiu a crise em Honduras com a deposição de Mel Zelaya, esquerda berrou “Golpe!”. E a boiada foi atrás, gritando “Golpe! Golpe! Golpe!”. Não adiantou argumentar. Já estava decidido que era golpe. Aquilo que eu e mais uns poucos tivemos o cuidado de fazer antes de opinar, ou seja, inteirar-se dos fatos e ler a Constituição de Honduras, foi considerado providência irrelevante.
Estava decidido que Honduras proporcionara caso singularíssimo à história universal: um golpe perpetrado em uníssono pela Assembléia Nacional e pela Corte Suprema do país. Zelaya, desrespeitando rígidos preceitos constitucionais e expressas determinações judiciais, era o único soldado de passo certo no batalhão das instituições golpistas.
Em que se sustenta tamanho disparate? A resposta mais óbvia é a que o meu leitor está considerando: a esquerda é perita em construir versões ao arrepio dos fatos. Mas a inacreditável alavanca que move a realidade para onde lhe convém dispunha, neste caso, de um pontinho de apoio: quando o Exército hondurenho, cumprindo ordem judicial, prendeu Zelaya, em vez de o colocar atrás
das grades (como talvez devesse), retirou-o do país. Aquele excesso de prudência para preservar a ordem pública foi o que bastou. O ex-presidente em pijamas, despachado para o exterior, era a imagem que a esquerda precisava para chamar de golpe um procedimento rigorosamente constitucional.
Quando Zelaya foi preso, já não era mais presidente por determinação da Corte Suprema. Talvez tenha havido um erro posterior, de natureza processual penal, mas até isso é duvidoso porque, na forma da constituição de Honduras, Zelaya perdeu a cidadania hondurenha ao pleitear reeleição. A questão aí envolvida pode suscitar gostos ou desgostos, despertar interesse jurídico, mas é irrelevante
sob o ponto de vista da legitimidade constitucional da deposição.
Pois eis que os sábios assessores de Lula em questões internacionais viram ali a chance de dar ao “cara” um certo sotaque latino-americano. O Brasil, como se sabe, tem com a democracia e os direitos humanos continentais responsabilidades que terminam na praia cubana de Varadero.
Cometemos, então, a grande burrada de albergar Zelaya na embaixada de Tegucigalpa, onde ele fez, com o refúgio que lhe foi concedido, o mesmo que antes tentara com o ordenamento constitucional de seu país. Tomou conta do pedaço, promoveu comícios, chamou sua turma e agiu de modo tão espaçoso que a representação brasileira precisou abandonar o ponto.
Agora, o povo de Honduras votou.Numa eleição absolutamente regular e de comparecimento voluntário (como também aqui deveria ser), a abstenção foi proporcionalmente a mesma da rumorosa eleição norte-americana que deu o poder a Obama. Mais de 60% dos eleitores compareceram às urnas (percentual que superou o do pleito vencido por Zelaya). O candidato eleito abriu larga margem sobre seu rival. O povo hondurenho decidiu sobre seu destino.
Diante disso, pergunto: até quando o governo brasileiro, para constrangimento nosso, vai continuar se metendo na vida daquela nação? Vamos prosseguir sustentando o insustentável? E a mídia militante, vai continuar mandando os fatos para o mesmo lugar onde Lula disse que o povo está?
Percival Puggina (64) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezena de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo e de Cuba, a tragédia da utopia. FEIJÃO COM ARROZ OU FEIJOADA? Todo governante, sentado na cadeira das decisões, se defronta com esta questão: onde gastar os escassos recursos de que dispõe? Abrem-se, de regra, dois caminhos: pode-se gastar conservando o que se tem, aumentando os empregos no setor público e priorizando as despesas de custeio, ou priorizar os investimentos, como forma de ampliar, através deles, as perspectivas do futuro.
O tema é relevante e se expressa na opção por uma dentre duas possibilidades: governar mais para o presente e menos para o futuro ou mais para o futuro e menos para o presente. Vamos comer feijão com arroz hoje ou preparar uma feijoada para amanhã? A experiência política mostra que o feijão com arroz é eleitoralmente mais bem sucedido que a feijoada, embora a feijoada entre para a história.
Na minha opinião, Fernando Henrique Cardoso fez muita bobagem, prestou excessiva
atenção ao que o PT dizia, mas preparou feijoada. Lula comeu a feijoada e preparou feijão com arroz. É nessa bandeja que almoça a política do dia a dia. Se o governante optar pela feijoada, a oposição reclamará da falta do feijão com arroz; se ele escolher o feijão com arroz, a oposição cobrará a feijoada. E não há como escapar desse stress, a menos que – numa situação absolutamente invulgar – existam recursos para fazer bem as duas coisas.
Não é por outra razão que a política deve ser confiada aos estadistas. Quem vota em qualquer um por razões menores deve, mesmo, ser governado por pigmeus. Para cuidar apenas do custeio, um gerente serve; para decidir sobre investimentos, precisa-se de um planejador; para escolher entre o bem e o mal, basta ter consciência bem formada. Mas para priorizar despesas, escolher o al menor (porque o bem nem sempre está disponível ou acessível), fazer na hora certa a opção correta entre custeio e despesa, se requer um estadista.
E nós só os teremos quando os partidos compreenderem que eleição é um episódio do processo político. A eleição passa, mas a política permanece. E a política só corresponderá às expectativas sociais quando os partidos se preocuparem com formar (e os eleitores com eleger) estadistas. Eles existem e estão por aí, cuidando de outras coisas, porque a política não lhes dá espaço.
Enquanto isso, falta feijão, falta arroz e a feijoada só aparece no cardápio dos marqueteiros.
Percival Puggina (64) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezena de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo e de Cuba, a tragédia da utopia. Fonte: Percival Puggina. Difusão: Geraldo Porci de Araújo.

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